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Há uma peça sendo encenada no palco da política nacional que guarda estranhas ressonâncias com um clássico da literatura brasileira. Enquanto em "Éramos Seis" acompanhamos a dissolução progressiva de uma família paulistana frente às adversidades da vida, testemunhamos agora a saga dos Bolsonaros - não como vítimas do tempo, mas como arquitetos de sua própria tragédia política, onde o drama familiar se confunde com o interesse público de maneira cada vez mais indissociável.
Jair Renan Bolsonaro, o "04", parece carregar nas costas o fardo de ser tanto herdeiro quanto espelho dos conflitos da família. Enquanto seu processo por lavagem de dinheiro e falsidade ideológica permanece sob sigilo na Justiça do DF, sua atuação como vereador em Balneário Camboriú ecoa o estilo combativo do clã. Seu voto solitário contra o "Dia da Democracia" e o projeto de combate a furtos de fios, seguido do episódio em que chamou a prefeita de "analfabeta funcional", revelam mais do que mera rebeldia política: mostram a dificuldade de construir uma identidade própria à sombra de um sobrenome que é simultaneamente trunfo e maldição.
Enquanto isso, os demais filhos do ex-presidente protagonizam seus próprios dramas:
Nos bastidores - ou nem tanto - Michelle Bolsonaro assume o papel de matriarca militante. Seu discurso em Goiás, onde chamou Lula e Janja de "casalzinho que demoniza Israel" e os acusou de tentar "enganar o povo cristão", revela uma estratégia familiar bem orquestrada: a apropriação de bandeiras morais e religiosas como instrumento de guerra política. Sua atuação à frente do PL Mulher a consolida não como mera esposa, mas como peça fundamental no projeto de poder da família.
E no centro desse drama, Jair Bolsonaro, o patriarca que aguarda os desdobramentos de processos que podem levá-lo a depor em CPIs, sempre pronto para se vestir com o manto da vítima de "perseguição política". Se em "Éramos Seis" acompanhamos a luta de uma família para se manter unida contra as intempéries, aqui testemunhamos o espetáculo de um clã que parece alimentar-se das crises que provoca.
A comparação com a obra de Maria José Dupré não é mero exercício de estilo. Assim como a família Lemos enfrentava sua decadência financeira e social, os Bolsonaros parecem travar uma batalha contra o que chamam de "perseguição", enquanto seus integrantes se espalham por diferentes frentes - do Congresso aos tribunais, das redes sociais aos palanques estrangeiros. A diferença crucial é que, enquanto os Lemos eram vítimas de seu tempo, os Bolsonaros são frequentemente autores de seus próprios infortúnios.
O que "Éramos Seis" nos mostra, no fundo, é que toda família carrega em si tanto a semente da união quanto a da dissolução. No caso dos Bolsonaros, a pergunta que permanece é se estarão fadados ao mesmo destino da família Lemos - a lenta erosão diante de forças maiores - ou se conseguirão reescrever seu próprio final. Pelos capítulos recentes, o desfecho parece mais próximo da tragédia do que do conto de fadas que talvez almejem.
Com informações de G1, Veja, UOL, Folha de S.Paulo, Gazeta do Povo, Poder360, Congresso em Foco, CNN, Euronews, O Globo, Estadão, Valor Econômico, Diário do Grande ABC, Notícias ao Minuto, InfoMoney, NP Expresso, O Dia, Agência Brasil, ND+, Metrópoles.■