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Fux: incoerência jurídica com motivação política
Ministro do STF declara incompetência da Corte para julgar núcleo de trama golpista, mas condena dois réus do mesmo processo, revelando contradições entre a própria prática e o próprio discurso
Artigo
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■   Bernardo Cahue, 11/09/2025

O ministro Luiz Fux protagonizou um dos votos mais contraditórios e politicamente sensíveis da recente história do Supremo Tribunal Federal (STF). Em seu voto no julgamento da ação penal sobre a tentativa de golpe de 8 de janeiro, Fux defendeu a nulidade de todo o processo por considerar o STF incompetente para julgar os réus, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro. No entanto, em seguida, procedeu ao julgamento do mérito e condenou dois dos réus, Walter Braga Netto e Mauro Cid, pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

A contradição da incompetência e o julgamento no mérito

Fux baseou seu voto preliminar na tese de que o STF seria "absolutamente incompetente" para processar e julgar os réus, uma vez que eles não ocupavam mais cargos com prerrogativa de foro no momento da denúncia. Ele argumentou que, cessados os mandatos, a competência para julgar os crimes comuns seria da justiça comum, e não do STF. Com isso, defendeu a nulidade de todos os atos processuais já realizados.

Contudo, em seguida, o ministro avaliou o mérito das acusações contra cada réu e votou pela condenação de Braga Netto e Mauro Cid. Essa postura foi considerada "incoerente" por juristas, pois se o STF é incompetente, não poderia julgar nenhum dos envolvidos, muito menos condenar parte deles.

A seletividade das condenações e a absolvição de Bolsonaro

Fux absolveu Bolsonaro e outros cinco réus (Almir Garnier, Alexandre Ramagem, Paulo Sérgio Nogueira, Augusto Heleno e Anderson Torres) de todas as acusações. Para o ex-presidente, argumentou que a cogitação de medidas de exceção não constitui crime e que não havia provas de que Bolsonaro tivesse ligação direta com os atos de vandalismo de 8 de janeiro.

Já para Braga Netto e Mauro Cid, Fux considerou que houve prova suficiente de que planejaram e financiaram atos violentos, incluindo supostos planos para assassinar o ministro Alexandre de Moraes. Essa seletividade nas condenações levanta questionamentos sobre a uniformidade na aplicação da jurisprudência.

Duplo padrão e possível motiviação política

A contradição de Fux não é inédita. Em 2021, ele foi um dos três ministros que votaram contra a anulação das condenações de Lula na Lava Jato, argumentando que a incompetência do juiz Sérgio Moro não causara prejuízos concretos à defesa. Agora, no caso Bolsonaro, ele defende que a eventual incompetência do STF é vício insanável que anula todo o processo.

Essa "flexibilidade jurídica" diante de casos politicamente sensíveis alimenta suspeitas de que seu voto tenha sido influenciado por fatores externos, como as ameaças de sanções dos EUA contra ministros do STF, amplamente divulgadas por bolsonaristas próximos a Donald Trump.

Repercussão e isolamento de Fux

O voto de Fux foi celebrado pela defesa de Bolsonaro, mas deixou perplexos colegas ministros e juristas. O advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho, ex-secretário Nacional de Justiça, classificou o voto como "tecnicamente incoerente" e avaliou que a falta de coerência deve isolá-lo na Primeira Turma.

Se nenhum outro ministro acompanhar as teses de Fux, o impacto jurídico de seu voto será nulo, mas o político é significativo. Ao se alinhar à defesa de Bolsonaro, Fux alimenta a narrativa de perseguição política e enfraquece a unidade do STF.

O julgamento será retomado com os votos dos ministros Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. A menos que um deles acompanhe Fux, sua visão contraditória sobre a competência e o mérito deve ficar restrita a um voto vencido.

Com informações de: VEJA, G1, BBC, Supremo Tribunal Federal, Agência Pública, CNN Brasil, Agência Brasil, ICL Notícias, Migalhas. ■