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Madagascar mergulhou em uma profunda crise constitucional e política nesta terça-feira (14 de outubro de 2025), após o presidente Andry Rajoelina, atualmente fora do país e em local desconhecido, dissolver o Parlamento, que, em resposta, ignorou a ordem e aprovou o seu impeachment. A sucessão de eventos representa um impasse de poder sem precedentes, agravado pela fuga de Rajoelina após um motim militar e pelo apoio massivo das forças de segurança aos protestos liderados pela Geração Z que tomaram as ruas.
O decreto presidencial de dissolução da Assembleia Nacional foi publicado nas redes sociais na manhã de terça-feira, com a justificativa de ser "necessário para restaurar a ordem dentro de nossa nação" e que "o povo precisa ser ouvido novamente. É hora da juventude". No entanto, a manobra foi amplamente interpretada como uma tentativa desesperada de bloquear o voto de impeachment que os legisladores já haviam convocado. O líder da oposição no Parlamento, Siteny Randrianasoloniaiko, declarou imediatamente que o decreto não era "legalmente válido", argumentando que o presidente da Assembleia Nacional não havia sido consultado, conforme exigido por procedimento. Horas depois, ignorando a dissolução, os deputados prosseguiram com a sessão e aprovaram o impeachment de Rajoelina por 130 votos a favor e um voto em branco. A presidência, por sua vez, emitiu um comunicado qualificando a reunião da assembleia como inconstitucional e, portanto, qualquer resolução como "nula e sem efeito".
O cenário de confronto direto entre os poderes Executivo e Legislativo tem como pano de fundo a dramática erosão do apoio a Rajoelina. A crise atingiu um ponto de inflexão no fim de semana, quando o CAPSAT, uma unidade de elite das Forças Armadas que foi crucial para a chegada de Rajoelina ao poder em 2009, desertou e se juntou aos protestos. A unidade anunciou que se recusaria a atirar nos manifestantes e, posteriormente, declarou que assumiu o controle das forças armadas do país. Nos dias seguintes, a polícia e a gendarmaria também romperam publicamente com o presidente e aliaram-se aos manifestantes. Rajoelina, em um discurso transmitido por vídeo na segunda-feira (13) de um "local seguro", afirmou que deixou o país com medo por sua vida após "tentativas ilegais e violentas de tomada de poder". Várias fontes, incluindo um militar e um político de oposição, relataram que ele partiu a bordo de um avião militar francês, informação que não foi oficialmente confirmada pelas autoridades da França.
Os protestos que detonaram a crise começaram em 25 de setembro, inicialmente motivados pelos cortes crônicos de água e eletricidade que assolam o país. No entanto, o movimento rapidamente se ampliou e passou a canalizar um profundo descontentamento com a corrupção, a má governança, a pobreza e a falta de oportunidades. Conhecido como a "Primavera dos Novinhos", o movimento é liderado por jovens da Geração Z, que se inspiraram em levantes semelhantes que desafiaram governos no Quênia, Nepal e Peru. A ONU informou que pelo menos 22 pessoas morreram em confrontos desde o início dos protestos. Milhares voltaram a ocupar a Praça 13 de Maio, em Antananarivo, nesta terça-feira, para celebrar a votação do impeachment e reiterar o apelo pela renúncia definitiva do presidente.
O desfecho imediato da crise é incerto. Enquanto Rajoelina insiste que permanece no cargo e prometeu realizar novas eleições a partir de dezembro, o Parlamento afirma que irá apontar um novo governo em breve. De acordo com a linha de sucessão constitucional, com a destituição do presidente do Senado, quem deveria assumir interinamente as funções presidenciais é Jean André Ndremanjary, novo nome indicado para o cargo. No entanto, com as instituições do país em disputa e as forças armadas divididas, Madagascar enfrenta seu pior tumulto político desde a crise de 2009, que levou o próprio Rajoelina ao poder.
Com informações de: The New York Times, G1, Associated Press, CNN, Al Jazeera, Le Monde. ■