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Os tratores em chamas em Bruxelas e os pneus queimados nas estradas brasileiras em 2022 são imagens de protesto, mas contam histórias radicalmente diferentes sobre o agronegócio na Europa e no Brasil. Enquanto milhares de agricultores europeus cercam instituições da UE para vetar o acordo com o Mercosul, temendo concorrência futura, o agro brasileiro, embora economicamente poderoso, demonstra reações políticas díspares: foi às ruas contestar urnas, mas permaneceu praticamente inerte diante do "tarifaço" de Donald Trump contra suas exportações. Esta análise crítica investiga as razões estruturais por trás dessa divergência de táticas e prioridades.
Os protestos europeus são ofensivos e preventivos. Seu alvo é um tratado de livre-comércio que, na visão dos agricultores franceses, belgas e holandeses, ameaça invadir o mercado com carne, açúcar e soja sul-americanos a preços mais baixos, graças a padrões ambientais e custos de produção distintos. Eles queimam caixões simbólicos que representam "a morte da agricultura" europeia. É uma mobilização para moldar o futuro, com forte teor geopolítico, apoiada por líderes como Macron, que usam a causa para ganhar capital político.
Já a mobilização do agro brasileiro, quando ocorre, tende a ser reativa e focada em crises imediatas. O exemplo mais recente e visceral não é sobre acordos, mas sobre falência. No Rio Grande do Sul, produtores ameaçam paralisação diante de uma "situação terrível" causada por secas e enchentes sucessivas, com prejuízos acumulados de R$ 106,6 bilhões e aumento de 1000% em recuperações judiciais. Suas demandas são por renegociação de dívidas e crédito emergencial, não por veto a tratados. A prioridade é salvar a propriedade da família hoje, não o mercado de amanhã.
A reação tépida do agro brasileiro ao retorno das altas tarifas de Trump é um dos contrastes mais reveladores. Para a Europa, o "tarifaço" americano é um dos principais motivos para acelerar o acordo com o Mercosul, buscando diversificar mercados. Para o Brasil, segundo maior exportador agropecuário global, a notícia foi recebida sem protestos massivos ou bloqueios de rodovias.
Especialistas apontam razões para essa aparente passividade:
A raiz da diferença está na estrutura econômica de cada setor:
Há uma ironia histórica no centro desse conflito. O mesmo agronegócio brasileiro que é alvo do protesto europeu — visto como uma ameaça por sua eficiência e custos — está, do lado de cá do oceano, paralisado por uma crise de rentabilidade e clima que ameaça produtores familiares e médios. Enquanto o agricultor francês teme pelo futuro diante do açúcar brasileiro, o produtor gaúcho não consegue pagar as contas do presente.
Os dois protestos, portanto, refletem as assimetrias da globalização. O europeu, politicamente organizado, tenta erguer barreiras para proteger um estilo de vida. O brasileiro, economicamente potente mas vulnerável, luta contra a bancarrota. Ambos gritam por socorro, mas um o faz para manter privilégios em um mundo que muda, e o outro, literalmente, para não morrer em silêncio.
Com informações de: G1, Gazeta do Povo, Agroadvance, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Associated Press (KENS5), Xinhua, ND Mais, Embrapa, RFI, Brasil de Fato ■