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O pavor estratégico de Trump e o assédio dos BRICS
A pressão máxima de Washington sobre Caracas vai além do petróleo: é uma tentativa desesperada de conter a formação de um novo polo de poder global, capitaneado por Rússia e China, que ameaça redefinir a ordem financeira e energética mundial
Analise
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■   Bernardo Cahue, 17/12/2025

A Venezuela como Peça-Chave no Tabuleiro Geopolítico

A recente escalada de tensões entre os Estados Unidos e a Venezuela, marcada pelo anúncio de bloqueio naval e pela apreensão de petroleiros, é frequentemente enquadrada como uma mera disputa por mudança de regime ou controle de recursos. No entanto, uma análise mais profunda revela um cenário mais complexo e de alcance global. O cerne do conflito é a integração da Venezuela ao bloco dos BRICS, uma manobra apoiada diretamente pela Rússia que representa uma ameaça existencial à hegemonia financeira e energética dos EUA. O presidente Nicolás Maduro, mesmo diante de um veto formal do Brasil, tem declarado publicamente que o país já é parte do grupo, demonstrando a prioridade estratégica que a aliança representa para Caracas.

A Transformação dos BRICS em uma Superpotência Energética

O cálculo que assusta estrategistas em Washington é aritmético e brutal. Atualmente, os países do BRICS controlam aproximadamente 8.7% das reservas mundiais de petróleo. A entrada da Venezuela, dona das maiores reservas provadas do planeta, estimadas em cerca de 303 bilhões de barris, alteraria radicalmente esse quadro.

  • Com a adesão venezuelana, a participação do bloco nas reservas globais saltaria para cerca de 26.2%.
  • Considerando a expansão do bloco em 2024, que incluiu potências como Arábia Saudita, Irã e Emirados Árabes, a fatia total controlada pelos BRICS+ chegaria a aproximadamente 60% de todo o petróleo conhecido no mundo.

Este domínio não se limitaria ao petróleo. Em gás natural, a influência do grupo também cresceria substancialmente, consolidando-o como o ator central na geopolítica da energia do século XXI. Para a administração Trump, que prioriza o "America First" e a segurança energética, a perspectiva de dois terços dos hidrocarbonetos mundiais sob a influência de um bloco rival é um pesadelo estratégico.

O Banco dos BRICS: A Arma Financeira que Assusta Washington

O controle das reservas é apenas uma parte da equação. A verdadeira revolução ocorre no sistema financeiro. O Banco de Desenvolvimento dos BRICS (NDB), presidido pela ex-presidente brasileira Dilma Rousseff, emerge como a instituição que poderia gerir e financiar projetos baseados nessa colossal riqueza energética. Este mecanismo oferece à Venezuela e a outros países sancionados uma rota de fuga do cerco económico ocidental.

A cooperação entre Rússia e Venezuela para criar sistemas de pagamento alternativos ao SWIFT e implementar o sistema de cartões russo MIR são passos concretos nessa direção. O acesso a linhas de crédito em moedas locais ou em uma cesta de divisas do BRICS, longe do dólar americano, neutralizaria o efeito paralisante das sanções dos EUA, principal instrumento de pressão de Washington sobre Caracas nos últimos anos. É esta autonomia financeira, simbolizada no NDB sob liderança latino-americana, que representa uma ameaça direta ao poder do dólar e às ferramentas de coerção económica norte-americanas.

A Estratégia de Pressão dos EUA e a Resposta da Aliança

As ações recentes de Trump devem ser lidas como uma tentativa de impedir essa consolidação antes que seja irreversível.

  1. Guerra Econômica e Naval: O bloqueio e a apreensão de petroleiros como o "Skipper" visam estrangular a já combalida produção petrolífera venezuelana, sua principal fonte de receita, e impedir que o país se fortaleça economicamente para integrar o bloco.
  2. Isolamento Diplomático: A pressão sobre aliados regionais, como o Brasil, para vetar a entrada da Venezuela nos BRICS, é outra frente. Apesar disso, a Rússia exerce contrapeso, apoiando abertamente a candidatura e reforçando laços com Caracas.
  3. Ameaça de Confisco de Ativos: Maduro já alertou que, em retaliação a qualquer ação mais agressiva, os contratos de empresas americanas como a Chevron seriam transferidos para companhias dos países BRICS, um movimento que aceleraria justamente o fluxo de tecnologia e capital que Washington quer bloquear.

Portanto, o "pavor" de Trump não é um medo abstrato, mas uma resposta calculada a uma reconfiguração tectônica do poder global. A guerra midiática e económica contra a Venezuela é, na realidade, o primeiro grande conflito da nova Guerra Fria multipolar. O objetivo imediato pode ser o governo Maduro, mas o alvo estratégico de longo prazo é frear a ascensão de um bloco coeso — Rússia, China e seus aliados no Sul Global — que possui, no petróleo venezuelano e no Banco de Dilma Rousseff, as ferramentas para construir um sistema internacional alternativo.

Com informações de: Click Petróleo e Gás, Jamestown.org, Brasil de Fato, CNN Brasil, Centro Estratégico Latinoamericano de Geopolítica (CELAG), Russia Pivot to Asia, Venezuela Analysis, Channel News Asia ■