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Agenda do medo: segurança pública ofusca economia no debate eleitoral
Em meio a indicadores econômicos em recuperação, pesquisas e discursos políticos amplificam estratégias de direita, forçando a segurança no centro do palco para 2026
Analise
Foto: https://www.estadao.com.br/resizer/v2/HD7R4MBTAFGYREXFQM3NZ6FI5A.jpg?quality=80&auth=c6f186ce328f6ff74e9a7b8d061ab5198b42a62953bf3cd24c48b8078ba54a15&width=380
■   Bernardo Cahue, 14/12/2025

O Palco Político e a Amplificação do Tema Segurança

A cena política nacional tem sido dominada por um roteiro previsível, onde governadores de oposição, como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), transformam a segurança pública na peça central de seu repertório contra o governo Lula. Em audiência na Câmara, Tarcísio classificou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança do governo federal como "cosmética", defendendo medidas como prisão em segunda instância e a supressão de direitos políticos de presos. Caiado foi além, acusando o PT de "complacência e conivência com as facções".

Esse posicionamento agressivo não é desconectado do calendário eleitoral. Ambos são citados como potenciais candidatos presidenciais em 2026, e o tema da segurança, inflamado por operações de grande impacto como a do Rio de Janeiro (que teve 57% de aprovação segundo o Datafolha), tornou-se uma plataforma conveniente. O discurso encontra eco em partes do Congresso, onde a PEC do governo corre risco de ser significativamente alterada, e serve como uma "munição contra o governo" que unifica setores da oposição.

A Economia Real em Contraponto à Narrativa de Crise

Enquanto a segurança é alçada ao status de emergência nacional, indicadores econômicos apontam para uma direção diferente, ainda que com nuances. O presidente Lula tem afirmado que o país vive "um bom momento econômico", citando controle inflacionário, baixo desemprego e crescimento da massa salarial. Projeções de analistas, como Samuel Pessôa, indicam um cenário de "pouso suave" para a economia, com inflação em trajetória de queda e crescimento modesto, mas positivo, previsto para 2025 e 2026.

No entanto, este cenário não é isento de nuvens escuras. O endividamento público tem crescido de forma preocupante, subindo 6,5 pontos percentuais do PIB desde o início do governo, pressionado por gastos crescentes. Para 2025, a previsão é de um déficit primário superior a R$ 70 bilhões. Este é o calcanhar de aquiles econômico que, paradoxalmente, não recebe a mesma ênfase midiática ou política que a segurança, sugerindo uma hierarquização estratégica de pautas.

A Metodologia das Pesquisas: Entre a Ciência e a Influência

A confiança em qualquer pesquisa de opinião reside na transparência de seu método. Institutos sérios seguem protocolos rígidos:

  • Amostragem representativa: O perfil dos entrevistados (gênero, idade, região, renda) deve espelhar o universo do eleitorado.
  • Seleção aleatória: Para evitar viés, os locais e os entrevistados são definidos por sorteio.
  • Margem de erro e nível de confiança: Parâmetros estatísticos que mostram a precisão da estimativa.

Pesquisas como as do Datafolha, que mostram Lula à frente de nomes da direita em cenários de segundo turno, seguem essas normas. No entanto, o risco de viés de agenda persiste. Quando o foco dos questionários e a divulgação dos resultados enfatizam incessantemente um único tema (como a segurança), eles podem, voluntariamente ou não, reforçar a percepção de que este é o problema mais urgente, relegando outros de igual importância, como a situação fiscal, a um segundo plano na mente do eleitor.

Isso se potencializa quando os dados são usados seletivamente. Um exemplo é a ênfase na aprovação de operações policiais de alto impacto, sem um questionamento igualmente robusto sobre temas econômicos complexos. A pergunta que fica é: as pesquisas estão medindo a realidade ou ajudando a construí-la?

Conclusão: O Jogo das Percepções na Reta para 2026

A conjuntura atual revela um jogo duplo. De um lado, uma narrativa política de crise e medo, capitaneada por setores da direita e alimentada por pesquisas que dão centralidade à segurança. De outro, uma realidade econômica mista, com melhoras sociais visíveis, mas desequilíbrios fiscais profundos que recebem menos holofote.

O efeito é a criação de um descompasso entre a agenda nacional e os desafios multifacetados do país. A constante amplificação de um único tema por pesquisas e discursos pode servir menos para informar o público e mais para alavancar imagens políticas específicas, notadamente as de figuras da direita que se apresentam como a solução única para a insegurança. Enquanto isso, o debate sobre o modelo de desenvolvimento, a sustentabilidade das contas públicas e a distribuição de renda — fundamentais para o bem-estar a longo prazo — corre o risco de ser ofuscado na corrida pela sucessão presidencial.

Com informações de: Folha de S.Paulo, Veja, BBC News Brasil, Datafolha, Senado Federal, G1, UOL ■