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Câmara aprova redução de penas para condenados do 8 de Janeiro em sessão tumultuada
Projeto que beneficia Jair Bolsonaro segue para o Senado; PT convoca protestos para domingo (14) contra o que classifica como "retrocesso" e "impunidade"
Politica
Foto: https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSA34tt0vMjP717F5xWwg4mJPzn_ClsFtiXvQ&s
■   Bernardo Cahue, 10/12/2025

Em uma sessão que se estendeu pela madrugada, a Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira (10) o Projeto de Lei 2.162/2023, conhecido como "PL da Dosimetria". A proposta, que altera regras do Código Penal e da Lei de Execução Penal, reduz as penas dos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O texto foi aprovado por 291 votos a 148 e agora segue para análise do Senado Federal.

A votação foi marcada por tensão e protestos. Horas antes, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) ocupou a cadeira do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), em um ato contra a pauta e um processo de cassação que o envolve. Ele foi retirado à força pela Polícia Legislativa, momento em que a transmissão da TV Câmara foi interrompida e jornalistas foram retirados do plenário. A decisão de pautar a votação, anunciada por Motta na terça-feira (9), pegou a base governista de surpresa.

As principais mudanças aprovadas

O relator do projeto, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), apresentou um substitutivo que não concede anistia, mas altera o cálculo das penas. As principais alterações aprovadas são:

  • Fim da soma de penas: Os crimes de "tentativa de golpe de Estado" e "abolição violenta do Estado Democrático de Direito" não terão mais suas penas somadas quando ocorridos no mesmo contexto. Apenas a pena do crime mais grave (o de golpe de Estado) será aplicada, com um acréscimo de um sexto até a metade.
  • Progressão de regime mais rápida: A saída do regime fechado poderá ocorrer após o cumprimento de 1/6 da pena (em vez de 1/4, como é a regra atual) para crimes em que não houve violência contra a vida.
  • Redução por contexto de multidão: A pena pode ser reduzida de um terço a dois terços para quem agiu em "contexto de multidão", desde que não tenha tido papel de liderança ou financiamento.
  • Remição de pena: O texto prevê que dias de trabalho ou estudo durante o cumprimento de prisão domiciliar possam ser convertidos em redução da pena.

Impacto direto no caso Bolsonaro

O ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos e 3 meses de prisão pela tentativa de golpe, é um dos principais beneficiados. Segundo cálculos do relator, com as novas regras:

  1. A pena total inicial seria reduzida de 27 anos e 3 meses para aproximadamente 20 anos e 8 meses, pela não soma dos dois principais crimes.
  2. Com a progressão mais rápida de regime (após 1/6 da pena) e a contagem do tempo em prisão domiciliar, o tempo em regime fechado cairia para cerca de 2 anos e 4 meses.
  3. Após esse período, ele poderia progredir para o regime semiaberto.

Paulinho da Força afirmou que a redução "é geral", beneficiando desde "a menina do batom" — referência a uma condenada por pichar uma estátua — até Bolsonaro.

Próximos passos: o trâmite no Senado

O projeto agora segue para o Senado, onde encontra um caminho disputado. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), afirmou que pretende colocá-lo em votação ainda em 2025. No entanto, há divergências sobre o rito:

  • O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Otto Alencar (PSD-BA), defende que um projeto de tal relevância deve passar pela comissão antes de ir ao plenário.
  • Otto Alencar já designou o senador Esperidião Amin (PP-SC) como relator do projeto na CCJ, com expectativa de parecer para a reunião da próxima quarta-feira (17).

Se aprovado no Senado, o texto vai para sanção do presidente Lula, que pode vetá-lo total ou parcialmente. Eventuais vetos ainda podem ser derrubados pelo Congresso.

Contexto político e reações

A aprovação ocorre em um cenário de forte tensão política. Reportagem flagrou deputados da base aliada atribuindo a pautação do projeto por Hugo Motta a uma insatisfação com o atraso no pagamento de emendas parlamentares pelo governo federal. Em conversa, um deputado relatou que líderes reclamaram do baixo percentual de emendas pagas, e que a pauta da dosimetria surgiu como uma moeda de troca.

Em reação imediata, o PT convocou protestos para este domingo (14), mobilizando militância e movimentos sociais contra o PL da Dosimetria e também contra o marco temporal de terras indígenas, votado no Senado. O partido classifica as medidas como "graves retrocessos".

Durante a sessão, o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), acusou Motta de conduzir "um ataque à democracia" e interferir em um julgamento em curso. O presidente da Câmara rebateu, citando que o PT votou contra a Constituição de 1988. Ao encerrar a votação, por volta das 4h, Motta declarou que a sociedade "não aguenta mais ouvir esse disco arranhado" e que era preciso "virar a página".

Com informações de: Gazeta do Povo, UOL, Agência Senado, O Globo, G1, BBC News Brasil, Agência Brasil ■