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Cela de Anderson Torres custaria mais de um salário por mês se alugada
Enquanto a superlotação é a regra, a cela de um ex-autoridade no Complexo da Papuda desafia a lógica do cotidiano prisional com requintes de privacidade e conforto
Analise
Foto: https://midias.romanews.com.br/2025/11/27/torres-cumpre-pena-de-24-anos-de-priso-em-regime-fechado-i4wxic4vs6.jpg
■   Bernardo Cahue, 28/11/2025

A cela que abriga Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF, no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, seria avaliada, se fosse um imóvel locável no mesmo setor, em aproximadamente 1,2 salário mínimo. O valor, no entanto, é o menor dos elementos que compõem um retrato crítico sobre as disparidades dentro do sistema prisional brasileiro.

As exigências e a estrutura da unidade prisional reservada a Torres vão muito além do padrão encontrado na maioria dos presídios do país. A análise aponta para uma hierarquização do conforto, na qual a regra é a privação, mas a exceção é negociada. Destaques da cela incluem:

  • Banheiro Privativo: Diferente da realidade da maioria dos presos, que compartilham celas coletivas e banheiros com dezenas de pessoas, a cela em questão possui um sanitário de uso exclusivo do detento.
  • Separação do Banheiro de Visitas: A arquitetura do espaço assegura que o banheiro utilizado pelo preso esteja fisicamente separado do destinado às visitas, um luxo incomum que reforça a distinção de tratamento.
  • Boxes Separados: Dentro do banheiro privativo, a presença de boxes individuais para chuveiro e vaso sanitário contrasta com os banheiros coletivos, sem qualquer divisória, comuns em outras celas.
  • Cama de Casal: O mobiliário inclui uma cama de casal, item que foge completamente do padrão carcerário convencional, composto por beliches ou camas de solteiro de estrutura metálica.

Essas características, quando confrontadas com a realidade da população carcerária brasileira, desenham um cenário de duas velocidades. Enquanto de um lado há celas superlotadas, insalubres e com infraestrutura precária, do outro, um seleto grupo desfruta de condições que miram, de forma distorcida, o padrão de um apartamento de baixa renda.

Especialistas em direito penal e sociologia apontam que essa distinção não é meramente física, mas simbólica. Ela evidencia como o status social, o poder aquisitivo e as conexões políticas de um detento podem influenciar diretamente sua experiência atrás das grades, perpetuando desigualdades mesmo em um ambiente supostamente destinado à igualação perante a lei.

A situação levanta questões fundamentais: Onde termina o direito à dignidade da pessoa presa e onde começa o privilégio? A existência de celas com tais especificidades para uma minoria não seria a negação prática do princípio constitucional de que todas as pessoas são iguais perante a lei?

O caso específico de Anderson Torres serve como um microcosmo de um problema endêmico. Ele escancara a necessidade de um debate profundo sobre a padronização das celas, a fiscalização rigorosa para evitar benesses e a real função social da pena em um país que possui uma das maiores populações carcerárias do mundo.

Com informações de Metrópoles, G1, UOL, Correio Braziliense ■