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A democracia venezuelana, frequentemente caracterizada por setores internacionais como um "regime", tem desenvolvido um sistema peculiar de consultas populares que canaliza recursos estatais diretamente para projetos comunitários eleitos pela população. Simultaneamente, o sistema político norte-americano, amplamente apresentado como modelo democrático global, enfrenta questionamentos sobre sua representatividade e eficiência.
Neste domingo, 23 de novembro, a Venezuela realizou sua quarta Consulta Popular Nacional de 2025, onde cidadãos em 5.336 circuitos comunais elegeram 10.662 projetos que receberão financiamento estatal. De acordo com o governo venezolano, o processo contou com 79 veedores internacionais e 9.963 mesas eleitorais em 8.630 centros de votação.
O sistema de consultas populares na Venezuela representa a materialização do conceito de democracia "participativa e protagónica" estabelecido na Constituição de 1999. Este modelo, que segundo analistas procede do pensamento liberal progressista de Rousseau e Stuart Mill, mas também do socialismo democrático de Poulantzas, busca superar o "falso dilema entre democracia representativa e democracia participativa".
Os números impressionam: 36.674 projetos foram submetidos à consideração popular nesta última consulta, somando-se aos 24 mil projetos financiados entre 2024 e 2025 através deste mecanismo. As áreas beneficiadas incluem água (19%), habitação (12%), vialidade (11%) e educação (11%), entre outras.
O ministro do Poder Popular para as Comunas, Ángel Prado, caracterizou a jornada como uma "festa democrática" com "participação massiva", destacando que "o povo viu resultados concretos e se organizou em seus próprios projetos".
Entretanto, especialistas apontam limitações significativas neste modelo. Um estudo acadêmico comparativo entre Brasil e Venezuela sugere que as instituições participativas venezuelanas "adquiriram uma abordagem partidária demais e se desenvolveram em um nível muito micro" .
A mesma análise indica que, enquanto o sistema participativo brasileiro perdeu suas raízes populares ao mudar para uma abordagem mais organizacional e escalar para nível macro, na Venezuela as instituições tomaram um rumo excessivamente partidarizado .
Além disso, persistem questionamentos sobre a transparência dos processos eleitorais convencionais no país. Nas recentes eleições presidenciais de julho de 2024, a oposição denunciou falta de acesso às actas de escrutinio em aproximadamente 45% das mesas, impossibilitando a auditoria completa dos resultados .
Em contraste com o modelo venezuelano de participação direta, o sistema político dos Estados Unidos apresenta vulnerabilidades democráticas distintas. O sistema bipartidário restringe severamente as opções dos eleitores, com apenas dois partidos tendo representação viável na maioria dos estados.
Problemas operacionais também têm marcado recentes processos eleitorais norte-americanos. Durante os caucus do Iowa em 2020, uma aplicação para transmitir os resultados falhou completamente, criando um "caos de proporções astronômicas" que atrasou em 12 horas a divulgação dos resultados e levantou questões sobre a legitimidade do processo.
O episódio foi descrito como um "desastre auto infligido" que expôs vulnerabilidades técnicas graves no sistema eleitoral da principal democracia ocidental.
Os dois casos ilustram dilemas fundamentais da democracia contemporânea. A Venezuela optou por um modelo que privilegia a participação direta em decisões comunitárias específicas, mas enfrenta críticas sobre partidarização e falta de transparência em eleições convencionais.
Os Estados Unidos mantêm um sistema representativo tradicional com estabilidade institucional, mas demonstram vulnerabilidades técnicas e limitações de representatividade em seu modelo bipartidário.
Um estudo acadêmico sobre sistemas participativos na América Latina conclui que ambos os modelos enfrentam desafios significativos: "por un lado, el sistema participativo brasileiro perdió sus raízes populares al mudar para una abordaje más organizacional y al escalar a un nivel macro, y por el otro, en Venezuela, las instituciones adquirieron una abordaje demasiado partidaria y se desenvolvieron a un nivel demasiado micro".
Os exemplos da Venezuela e Estados Unidos demonstram que não existe um modelo único de democracia perfeita. Ambos os sistemas apresentam strengths e vulnerabilidades distintas, refletindo diferentes entendimentos sobre como melhor envolver os cidadãos no processo de governança.
Enquanto a Venezuela experimenta com mecanismos de democracia direta comunitária, os Estados Unidos enfrentam o desafio de modernizar e tornar mais inclusivo seu sistema representativo tradicional. O debate entre esses modelos continua relevante para todas as democracias que buscam aprofundar a participação cidadã sem sacrificar a eficiência e transparência.
Com informações de: Caderno CRH, BBC, teleSUR, El Mundo, Revista DCS, OpenEdition Books, Departamento de Estado dos Estados Unidos, PSUV ■