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Celeridade judicial: os casos que testam a eficácia da Justiça brasileira
Enquanto o STF age com rapidez dentro dos ritos legais no caso Bolsonaro, outros processos envolvendo figuras políticas de alto escalão aguardam desfecho e colocam à prova a capacidade do sistema de oferecer respostas céleres e eficazes frente a ameaças constantes de fuga
Analise
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■   Bernardo Cahue, 22/11/2025

Em um cenário político e judicial complexo, a celeridade na conclusão de julgamentos e investigações torna-se um termômetro da eficiência das instituições democráticas. A recente prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro, decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, demonstrou a capacidade de ação rápida do Supremo Tribunal Federal (STF) quando há risco iminente à ordem pública ou à aplicação da lei. No entanto, essa mesma agilidade é posta à prova em uma série de outros processos de grande repercussão que envolvem figuras proeminentes, como a deputada Júlia Zanatta, o também deputado Eduardo Bolsonaro, o senador Sérgio Moro e os desdobramentos do assassinato de Marielle Franco. A demora na conclusão desses casos pode alimentar narrativas de impunidade seletiva e minar a confiança da sociedade no sistema de Justiça.

Júlia Zanatta (PL-SC): Investigação por Desvio de Recursos Federais

A deputada federal Júlia Zanatta enfrenta uma investigação na Procuradoria-Geral da República (PGR) sob a suspeita de ter destinado uma emenda parlamentar de R$ 800 mil a um clube de tiro privado, o Top Gun, cujos proprietários mantêm ligações políticas e pessoais com a parlamentar. A denúncia, apresentada pela deputada Ana Paula Lima (PT-SC), alega que a emenda aparentemente foi construída para "beneficiar, com recursos federais, um negócio de aliados".

O Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE-SC) já identificou indícios de irregularidades no processo licitatório conduzido pela Prefeitura de São José, incluindo pesquisa de preços restrita, critérios sob medida e até documento com data falsa. A representação na PGR aponta para a possibilidade de crimes como frustração de licitação, peculato-desvio e corrupção. Em resposta, Zanatta defendeu a legalidade da emesa e afirmou que continuará destinando recursos para treinamento de guardas municipais e até para a "compra de munição, fuzil e tudo que for necessário". A celeridade na apuração é crucial neste caso, que envolve o desvio de finalidade de recursos públicos para uma estrutura privada armamentista, um tema de extrema sensibilidade.

Eduardo Bolsonaro (PL-SP): Réu por Coação ao STF e Perspectiva de Julgamento em 2026

Em um movimento judicial significativo, a Primeira Turma do STF tornou Eduardo Bolsonaro réu pelo crime de coação no curso do processo. A acusação da PGR sustenta que o deputado, atuando a partir dos Estados Unidos, articulou a imposição de sanções pelo governo norte-americano – incluindo o chamado "tarifaço" e a aplicação da Lei Magnitsky contra ministros do STF – com o objetivo de criar um "ambiente de intimidação" e interferir no julgamento de seu pai, Jair Bolsonaro.

O ministro relator, Alexandre de Moraes, foi taxativo ao afirmar que a conduta do parlamentar configura "grave ameaça" materializada por meio de "sanções do governo dos Estados Unidos". Apesar da unanimidade em receber a denúncia, a expectativa no STF é de que o desfecho final deste processo só ocorra em 2026. Este cronograma coloca em evidência o contraste entre a rapidez em decretar prisões e o ritmo normalmente mais lento dos julgamentos de mérito, especialmente quando envolvem questões complexas de relações internacionais.

Sérgio Moro (UNIÃO-PR): Denúncia de Venda de Sentenças que o Tornou Réu

O senador Sergio Moro (União-PR) encontra-se atualmente na condição de réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por calúnia contra o ministro Gilmar Mendes. A ação penal teve origem em um vídeo, gravado em 2022, no qual Moro afirma, em tom jocoso, que iria "comprar um habeas corpus" do magistrado. A acusação, que ele depois classificou como uma "expressão infeliz" em um "ambiente de festa junina", foi interpretada pelo STF como uma imputação falsa de crime de corrupção passiva a um ministro da Corte. O caso ganha contornos de profunda ironia quando contrastado com as investigações da Operação Sisamnes, que desvendou um esquema estruturado e real de manipulação e venda de sentenças no Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme detalhado em relatórios da Polícia Federal (PF)

Caso Marielle Franco: Os Desdobramentos e a Investigação sobre os Mandantes

As investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, continuam a revelar novos detalhes sobre a trama. A Polícia Federal apontou a existência de um miliciano infiltrado no PSOL, partido de Marielle, com o objetivo de levantar informações sobre sua atuação parlamentar. Laerte Silva de Lima, o suposto infiltrado, seria o elo entre os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, presos preventivamente sob suspeita de serem os mandantes do crime.

De acordo com a delação premiada do ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor, Domingos Brazão teria encomendado o assassinato porque via a atuação de Marielle nas discussões sobre regularização fundiária e loteamentos de milícia na Zona Oeste do Rio de Janeiro como uma ameaça a seus interesses. A PF também avalia que o infiltrado pode ter "sobrevalorizado" ou mesmo "inventado" informações para os Brazão, levando a um "superdimensionamento" das ações da vereadora. A celeridade na conclusão deste caso, que já se arrasta por anos, é fundamental para que todos os envolvidos, incluindo os mandantes intelectuais, sejam responsabilizados.

Conclusão: A Justiça sob Pressão do Tempo

Os casos analisados revelam um Judiciário sob tensão, forçado a equilibrar a necessidade de rigoroso devido processo legal com a demanda social por respostas ágeis. A prisão de Jair Bolsonaro mostrou que o STF pode agir com presteza diante de riscos concretos. No entanto, a perspectiva de um julgamento de Eduardo Bolsonaro apenas em 2026, a investigação em curso contra Júlia Zanatta e a longa tramitação do caso Marielle Franco lembram que a justiça célere nem sempre é a regra.

Em um ambiente político polarizado, a demora no julgamento de processos de alta visibilidade pode ser instrumentalizada para criticar a lentidão da Justiça ou, de forma contraditória, para acusá-la de seletiva. A credibilidade das instituições depende, em grande medida, de sua capacidade de demonstrar que a lei é aplicada a todos de forma igualitária e tempestiva, sem atropelos, mas também sem delongas desnecessárias. O desafio que se coloca é assegurar que a celeridade observada em momentos de crise se torne uma característica permanente do sistema, e não uma exceção.

Com informações de: Notícias UOL, G1, Senado Federal, Brasil Paralelo, ICL Notícias, Agência Brasil, Tribunal Superior Eleitoral, JC UOL, O Globo, Supremo Tribunal Federal ■