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Escândalo do Banco Master ameaça desvendar alianças ocultas no coração financeiro do país
Especialista aponta que investigação sobre fraude de R$ 12,2 bi pode revelar o funcionamento interno da "Faria Lima" e suas conexões com o poder político
Analise
Foto: https://cdn.brasil247.com/pb-b247gcp/swp/jtjeq9/media/20240815140832_db1cf329a790886fe55d0cb9bff99655fe19c7b8e56a7d70ca0efae2c206d897.jpg
■   Bernardo Cahue, 20/11/2025

A liquidação do Banco Master e a prisão de seu controlador, Daniel Vorcaro, suspeito de aplicar um prejuízo de R$ 12,2 bilhões ao sistema financeiro, representam mais do que o colapso de uma única instituição. Para o economista e ex-banqueiro Eduardo Moreira, o caso é uma oportunidade histórica de "desvendar o funcionamento da Faria Lima" e expor uma rede complexa que conecta o mercado financeiro, políticos e fundos de investimento públicos.

O Modelo de Negócios Insustentável

O Banco Master cresceu de forma meteórica e agressiva. De 2019 a 2024, seu patrimônio saltou de R$ 219,6 milhões para R$ 4,7 bilhões, enquanto o lucro líquido foi de R$ 38,5 milhões para R$ 1,068 bilhão. Essa expansão foi alimentada por uma estratégia considerada arriscada e pouco convencional:

  • Captação a qualquer custo: O banco emitia Certificados de Depósito Bancário (CDBs) com taxas de juros anormalmente altas, chegando a oferecer mais de 130% do CDI, muito acima da média do mercado.
  • A blindagem do FGC: Esses CDBs contavam com a cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), o que atraía investidores com a promessa de retorno alto e segurança.
  • Ativos de liquidez duvidosa: O dinheiro captado era aplicado em investimentos de alto risco e baixa liquidez, como precatórios (dívidas judiciais) e participações em empresas com problemas financeiros.

A Teia Política e as Tentativas de Salvamento

Conforme a crise do banco se aprofundava, Vorcaro acionou sua extensa rede de influências em uma tentativa desesperada de evitar o colapso. A chave dessa estratégia foi uma articulação política de alto escalão.

  • A "Trinca" do Centrão: O controlador do Master foi levado ao centro do poder em Brasília pela chamada "trinca", composta pelo presidente do PP, Ciro Nogueira; o presidente do União Brasil, Antônio Rueda; e o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) .
  • O acordo com o BRB: A manobra central foi a tentativa de vender o Banco Master para o BRB (Banco de Brasília), um banco público controlado pelo governador do DF, Ibaneis Rocha. Investigações da Polícia Federal apontam que a operação de compra era uma medida destinada a "acobertar as fraudes".
  • Blindagem com ex-autoridades: Para lubrificar seus canais de comunicação com o governo, o Master contratou consultores de peso, como o ex-presidente Michel Temer, o ex-presidente do BC Henrique Meirelles e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.

A Fraude das Carteiras Falsas e a Intervenção Final

O que começou como uma crise de liquidez transformou-se em um escândalo de fraude em larga escala. A Polícia Federal investiga um esquema no qual o Banco Master vendeu ao BRB R$ 12,2 bilhões em carteiras de crédito falsas, a maior parte de empréstimos consignados.

De acordo com as investigações, o Master adquiriu essas carteiras de uma "empresa de prateleira" chamada Tirreno – criada no fim de 2024 e dirigida por um ex-funcionário do banco – sem realizar qualquer pagamento por elas. Imediatamente, o banco as revendeu ao BRB, que efetuou o pagamento à vista. A PF concluiu que a operação foi arquitetada por "pura camaradagem" como uma "tentativa de abafar a fiscalização" do Banco Central.

A gota d'água para a intervenção foi um anúncio feito na segunda-feira (17) sobre um suposto acordo de recapitalização com o grupo Fictor Holding

Conexões com o Crime Organizado e o "Carbono Oculto"

O escândalo pode ter ramificações ainda mais sombrias. Reportagens apontam que o Banco Master e outros negócios de Daniel Vorcaro receberam investimentos bilionários do fundo Hans 95, da Reag, o maior fundo investigado pela Operação Carbono Oculto da Polícia Federal.

Esse fundo, que movimentou cerca de R$ 35 bilhões, está no centro de uma investigação que apura as conexões entre o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o mercado financeiro formal, a chamada "Faria Lima".

O Impacto e o Rastro de Prejuízos

A quebra do Banco Master já é considerada o maior fracasso bancário da história do Brasil em termos de impacto no sistema de garantia de depósitos . O FGC terá que cobrir R$ 41 bilhões em CDBs segurados, valor que supera o custo corrigido da quebra do Bamerindus.

Além disso, o colapso deixou um rastro de prejuízos em fundos públicos:

  • 18 fundos de pensão estaduais e municipais têm R$ 1,86 bilhão aplicados em letras financeiras do Banco Master.
  • Diferentemente dos investimentos de pessoas físicas, esses valores não contam com a proteção do FGC.
  • Entre os mais expostos estão a Rio Previdência (RJ), com R$ 970 milhões, e o Estado do Amapá, com R$ 400 milhões. Eventuais perdas terão que ser cobertas pelos cofres públicos dos estados e municípios.

Um Sistema sob Escrutínio

Eduardo Moreira amplia o conceito de crime organizado ao incluir esquemas financeiros e corrupção política que, em sua avaliação, operam de forma semelhante a uma máfia. "A Faria Lima mostrou crime organizado no setor de combustíveis, criptomoedas. Isso é igual máfia, tem três famílias que dominam", afirmou o economista.

Ele e outros analistas enxergam a ação firme do Banco Central, que decretou a liquidação extrajudicial do banco e resistiu a fortes pressões políticas, como um ponto positivo em meio à crise. "Se essa operação não foi fechada temos que dar o mérito para o Banco Central, porque, com certeza, houve pressão para essa operação ser fechada", disse Moreira.

Com a liquidação em curso e as investigações da Polícia Federal se aprofundando, a promessa é de que novas e reveladoras conexões entre o dinheiro, o poder e o mercado financeiro brasileiro venham à tona.

Com informações de Valor International, ICL Notícias, Metrópoles, Gazetaweb e Gazeta do Povo ■