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O governo do presidente Donald Trump ordenou o deslocamento do grupo de ataque do porta-aviões USS Gerald Ford, o maior e mais avançado do mundo, para o Mar do Caribe, em uma escalada militar descrita como "inequívoca" por analistas. A justificativa oficial é o combate ao narcotráfico e a organizações que Washington classifica como "narcoterroristas", com o foco no governo de Nicolás Maduro, acusado de chefiar o chamado "Cartel de los Soles". No entanto, uma peça crucial desse quebra-cabeça geopolítico vem à tona através das revelações de Jordan Goudreau, um ex-boina-verde que liderou uma fracassada tentativa de invasão da Venezuela em 2020: ele afirma que a CIA esteve envolvida na criação desse mesmo cartel décadas atrás.
Essas denúncias, somadas a dados que contradizem a narrativa oficial sobre as rotas das drogas, pintam um quadro complexo no qual a retórica antidrogas serviria como pano de fundo para uma operação de mudança de regime, tendo como pano de fundo as vastas reservas de petróleo venezuelanas.
A presença militar dos EUA na região atingiu um patamar inédito nas últimas décadas. O USS Gerald Ford, uma fortaleza flutuante com capacidade para mais de 75 aeronaves e 5 mil militares, é a joia da coroa desse dispêndio de força. Seu grupo de ataque inclui três destróieres, esquadrões de caças F-18 e helicópteros de ataque. Essa força soma-se a uma já impressionante concentração de poder naval e aéreo, que inclui oito navios de guerra, um submarino nuclear, caças F-35 em Porto Rico, bombardeiros B-52 e drones MQ-9.
Para o Pentágono, a missão é "ampliar e fortalecer as capacidades existentes para interromper o tráfico de drogas". No entanto, especialistas veem uma mensagem mais contundente. "O USS Gerald Ford é um dos maiores poderes de fogo navais que os EUA podem projetar. Seu envio é sinal inequívoco de que os EUA estão dispostos a usar força militar muito além do que tem sido feito", afirmou ao G1 Vitelio Brustolin, professor de Relações Internacionais da UFF e pesquisador de Harvard. Ele avalia que o poder de fogo é desproporcional para o combate ao narcotráfico e configura uma "ameaça direta" ao regime Maduro.
O governo Trump baseia sua ofensiva na acusação de que Nicolás Maduro é o líder de uma organização de narcotráfico, o "Cartel de los Soles", e ofereceu uma recompensa de US$ 50 milhões por informações que levem à sua captura. Operações militares já estão em curso, com ataques a embarcações que supostamente transportavam drogas, resultando em dezenas de mortos.
Entretanto, dados oficiais e relatórios internacionais colocam em xeque o alvo escolhido por Trump:
Essas inconsistências levantam questões sobre os motivos reais. "Não se trata de drogas", diz Christopher Sabatini, pesquisador do Chatham House, à BBC. "Mas ele se apropriou da linguagem da oposição venezuelana de que esta não é apenas uma ditadura — é um regime criminoso". O objetivo final, apontam analistas, é uma mudança de regime, e a campanha antidrogas seria o veículo para isso.
Nesse contexto, as declarações de Jordan Goudreau soam como um ajuste de contas explosivo. Goudreau, atualmente enfrentando processos nos EUA por tentativa de exportar ilegalmente armas para a Colômbia para sua operação na Venezuela, deu uma entrevista ao site The Grayzone.
O ex-militar, que liderou a fracassada "Operação Gideon" em 2020 – uma tentativa de invadir a Venezuela com um grupo de mercenários que terminou com vários mortos e dois americanos presos – fez uma acusação gravíssima: a CIA criou o "Cartel de los Soles" na década de 1990.
"Na década de 1990, o Cartel de los Soles foi criado pela CIA. Isso não é segredo; é a verdade", afirmou Goudreau. Questionado para confirmar se a inteligência americana foi responsável pela formação do grupo, ele respondeu: "Ah, absolutamente". Ele alegou ainda que a CIA "facilitou o tráfico de drogas através deste grupo" e que o nome "Cartel de los Soles" teria origem como "quase uma piada" dentro dos círculos de inteligência dos EUA, baseado no emblema de sol usado nas patentes dos militares venezuelanos.
As alegações de Goudreau, embora feitas por uma figura polêmica e com interesse próprio no caso, ecoam a complexa história do "Cartel de los Soles". Reportagens históricas indicam que o nome surgiu antes do governo de Hugo Chávez, envolvendo generais da Guardia Nacional venezuelana presos em escândalos de tráfico de drogas nos anos 90, durante o governo de Rafael Caldera, o que coincide com a linha do tempo apresentada por Goudreau.
A crise atual é, portanto, uma convergência de fatores: uma massiva demonstração de força militar, uma justificativa oficial que não resiste a dados factuais e revelações que lançam uma sombra sobre a história do próprio "inimigo" que Washington agora se propõe a combater.
Enquanto Maduro apela em inglês – "no crazy war, please" – e promete resistir, líderes regionais como o presidente Lula se manifestam contra a intervenção. O destino da Venezuela parece pendular entre a pressão militar e diplomática. As denúncias de Goudreau, sejam elas totalmente precisas ou não, adicionam uma camada crucial de complexidade a um conflito que, na superfície, é vendido como uma simples guerra contra as drogas, mas que, nas profundezas, envolve petróleo, geopolítica e um passado que teima em não ficar para trás.
Com informações de: BBC, CBS News, CNN Brasil, DW, G1, Ice.gov, Latin Times, RunRun. ■