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Um vÃdeo de poucos segundos, gravado em uma festa junina em 2022, se tornou o centro de uma batalha jurÃdica e polÃtica que expõe as contradições do bolsonarismo em relação à liberdade de expressão. Nele, o senador Sergio Moro (União-PR), segurando um copo, ouve alguém ao fundo dizer "Está subornando o velho" e responde: "Não, isso é fiança... instituto. Pra comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes". A ação, movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR), segue seu curso no Supremo Tribunal Federal (STF), com julgamento pautado para outubro.
Diante do processo, que pode levar à cassação de seu mandato caso a condenação supere quatro anos de prisão, Moro e seus apoiadores articularam uma defesa que rapidamente ecoou nas redes sociais, baseada em dois pilares principais:
Em entrevista, o próprio Moro reconheceu ter feito uma "brincadeira infeliz", mas manteve o cerne de sua defesa: "Jamais imaginei que poderia inferir uma acusação contra o ministro". Para seus apoiadores, a acusação de calúnia – que implica atribuir falsamente um crime a alguém – seria, portanto, desproporcional e uma tentativa de cercear a liberdade de expressão e a crÃtica.
Essa postura defensiva, que apela para o direito ao humor e à livre expressão, contrasta violentamente com a reação da mesma base polÃtica em um caso anterior envolvendo o influenciador digital Felipe Neto. Em março de 2021, após chamar o então presidente Jair Bolsonaro de "genocida" em suas redes sociais, em meio à gestão criticada da pandemia de COVID-19, o youtuber foi alvo de um inquérito da PolÃcia Civil do Rio de Janeiro.
A investigação foi aberta a pedido do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do ex-presidente, que utilizou a Lei de Segurança Nacional (LSN) – norma criada durante o perÃodo da ditadura militar – para criminalizar a crÃtica. Diferente da defesa de Moro, setores bolsonaristas não apenas apoiaram a medida, como aplaudiram a abertura do inquérito. A investigação, no entanto, foi subsequentemente suspensa pela Justiça, que não vislumbrou o crime de segurança nacional na conduta do youtuber.
A tabela abaixo sintetiza a postura seletiva em relação aos dois episódios:
Essa dualidade de critérios revela uma instrumentalização da lei e dos princÃpios democráticos conforme a conveniência polÃtica. O mesmo grupo que defende a invocação de uma lei autoritária da ditadura para silenciar um crÃtico é o que se levanta contra a aplicação do Código Penal a um aliado, ainda que este tenha direcionado sua fala a um ministro do STF no exercÃcio de suas funções.
O caso Moro é tratado como uma mera "piada infeliz" que não deveria ter consequências, enquanto a fala de Felipe Neto, uma crÃtica polÃtica em um contexto de grave crise de saúde pública, foi enquadrada como uma ameaça à segurança nacional. A defesa da "liberdade de expressão" parece, portanto, valer apenas quando a voz que se eleva é amigável aos seus interesses. Para opositores, a tolerância é zero e o arcabouço legal mais pesado é legitimado.
O julgamento de Moro no STF, portanto, transcende a figura do senador. Ele se torna um sÃmbolo de um debate intoxicado sobre até onde vai o direito de expressar opiniões, crÃticas e até mesmo brincadeiras no espaço público – e, sobretudo, sobre quem pode fazê-lo e com que custos. A seletividade gritante no tratamento desses dois casos deixa claro que, para uma parcela da polÃtica brasileira, princÃpios como a liberdade de expressão são, na prática, negociáveis.
Com informações de: CNN Brasil, Gazeta do Povo, CartaCapital, Brasil 247, Jovem Pan, Correio Braziliense, O Globo. ■