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Quase cinco décadas separam a Lei da Anistia de 1979 da proposta que avança no Congresso Nacional para perdoar condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Ambas são chamadas de "anistia", mas nascem em contextos radicalmente diferentes: uma marcou o inÃcio do fim de uma ditadura militar; a outra, se aprovada, pode significar um perdão para crimes contra a democracia cometidos sob um governo eleito.
Sancionada pelo general João Baptista Figueiredo em 28 de agosto de 1979, a Lei nº 6.683 foi um marco na abertura polÃtica após 15 anos de regime militar. Ela concedeu perdão a todos que cometeram "crimes polÃticos ou conexos" entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.
Na prática, a lei:
No entanto, a lei não foi uma concessão gratuita do regime. Além de não ter dado indulto aos presos por associação com movimentos pró-democracia, ela foi resultado de uma intensa pressão social, liderada por entidades como o Movimento Feminino pela Anistia (liderado por Therezinha Zerbini) e o Comitê Brasileiro pela Anistia, que defendiam uma anistia "ampla, geral e irrestrita".
O ponto mais controverso da Lei de 1979, e que gera debates até hoje, foi a anistia bilateral. A interpretação do termo "crimes conexos" acabou por estender o perdão não apenas aos que se opuseram à ditadura, mas também aos agentes do Estado – militares, policiais – que cometeram crimes como tortura, assassinatos e desaparecimentos forçados.
Dados da Comissão de Anistia mostram que, entre os quase 40 mil processos deferidos, 4.514 beneficiaram membros das Forças Armadas, além de outros integrantes de forças policiais. Esta interpretação foi posteriormente mantida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2010, mas é criticada por organizações de direitos humanos e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que argumentam que crimes de tortura são imprescritÃveis e não deveriam ter sido anistiados.
A anistia permitiu que grandes nomes da polÃtica e da cultura brasileira voltassem ao paÃs ou recuperassem sua liberdade e direitos. Entre os anistiados mais conhecidos estão:
É crucial diferenciar: a lei concedeu o perdão jurÃdico e a reintegração, mas indenizações econômicas mensais (reparação) são processos distintos, analisados caso a caso pela Comissão de Anistia, e não beneficiam a maioria dos nomes famosos.
O projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados, cuja urgência foi aprovada em setembro de 2025, busca anistiar pessoas condenadas por crimes cometidos durante as manifestações antidemocráticas que culminaram na invasão dos prédios dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Seus defensores argumentam que a medida é um "perdão polÃtico" necessário para acalmar os ânimos no paÃs.
As principais diferenças em relação à lei de 1979 são gritantes:
Juristas e entidades de direitos humanos alertam que anistiar crimes contra a democracia enfraquece o Estado de Direito e pode criar um precedente perigoso de impunidade para futuras tentativas de golpe.
A Lei da Anistia de 1979, apesar de suas imperfeições e da polêmica proteção aos agentes da repressão, foi um passo fundamental para a redemocratização do Brasil. Ela fechou um ciclo de autoritarismo, ainda que de forma incompleta.
A proposta de 2025, em análise no Congresso, opera na direção oposta: surge em um ambiente democrático e busca perdoar aqueles que atacaram suas instituições. A comparação entre os dois momentos revela não apenas diferenças jurÃdicas e contextuais, mas dois projetos distintos para a memória e a justiça no Brasil. Enquanto a primeira tentou virar uma página sombria da história, a segunda pode riscar capÃtulos essenciais da Constituição que a própria democracia permitiu escrever.
Com informações de: BBC News Brasil, G1, Estadão Verifica, CNN Brasil, Wikipedia, Senado Federal, Focus Brasil. ■