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América Latina se divide ante a crescente tensão dos EUA com a Venezuela
Entre a mediação e o alinhamento automático, a região testemunha sua fragmentação geopolítica enquanto a crise aérea aprofunda o isolamento de Caracas
America do Sul
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■   Bernardo Cahue, 30/11/2025

A escalada militar dos Estados Unidos no Caribe e as ameaças contra o governo de Nicolás Maduro forçam os principais países da América Latina a definirem suas posições estratégicas, revelando um continente dividido entre o alinhamento incondicional com Washington, a mediação cautelosa e a defesa intransigente da soberania nacional.

O Estopim da Crise

A tensão alcançou um novo patamar quando o presidente Donald Trump anunciou, via redes sociais, que o espaço aéreo "sobre e ao redor" da Venezuela estaria "fechado em sua totalidade", uma medida que o governo venezuelano repudiou como uma "ameaça colonialista". Este anúncio agravou uma crise aérea que já afetava milhares de passageiros, depois que a Administração Federal de Aviação (FAA) dos EUA emitiu um alerta recomendando extrema precaução ao sobrevoar o país. Em retaliação, o governo venezuelano revogou as concessões de voo de pelo menos seis companhias aéreas internacionais que haviam suspendido suas operações, acusando-as de se somarem a ações de "terrorismo" promovidas pelos EUA. De acordo com a IATA, cerca de 15.000 passageiros são afetados a cada semana com as suspensões, isolando ainda mais o país.

As Posições das Potências Regionais

Perante este cenário de potencial conflito, as nações mais influentes da região adotaram posturas diplomáticas distintas, refletindo seus interesses nacionais e alinhamentos geopolíticos.

Brasil: A Preocupação com a Estabilidade Regional

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está "muito preocupado" com o desdobramento militar no Caribe. O Brasil, que compartilha uma extensa fronteira com a Venezuela na Amazônia, não quer ver ações militares em sua zona natural de influência. Lula chegou a oferecer seus bons ofícios para mediar uma redução da pressão contra o regime chavista, oferta que foi ignorada por Trump. Para o governo brasileiro, um conflito armado representaria um "cenário de pesadelo", com potencial de gerar uma crise de refugiados e instabilidade em toda a região fronteiriça. A posição de Lula é de pedir paz e neutralidade, evitando apoiar tanto Maduro, cuja eleição em 2024 não reconheceu devido a alegações de fraude, quanto um ataque militar sem aval do Conselho de Segurança da ONU.

México: O Equilíbrio Pragmático

O México adota uma postura de equilíbrio. Por um lado, a presidente Claudia Sheinbaum anunciou um acordo com os EUA para que a Marinha mexicana seja a encarregada de interceptar embarcações suspeitas em águas internacionais próximas, um cortafogo para evitar que os bombardeios se estendam ao seu território. Por outro, mantém uma relação pragmática com Venezuela, baseada na doutrina Estrada, que privilegia a autodeterminação dos povos e a não intervenção. A nação não reconhecerá nem desconhecerá oficialmente Maduro, mantendo relações diplomáticas como sempre, mas sem uma relação de proximidade. Recentemente, Sheinbaum enviou uma representação diplomática à posse de Maduro, um gesto que sinaliza uma ligeira inflexão em sua pretensa neutralidade.

Colombia: O Dilema do Vizinho Fronteiriço

A Colômbia, que compartilha mais de mil quilômetros de fronteira e abriga milhões de migrantes venezuelanos, é talvez o país mais sensível aos ecos de uma escalada bélica. O presidente Gustavo Petro enfrenta um complexo dilema interno e externo, agravado pela proximidade das eleições presidenciais. Petro deixou claro que apoia uma transição política em Caracas, mas se opõe veementemente a uma intervenção militar estadunidense. "Eu não apoio Maduro; quero uma solução política e pacífica na Venezuela, não apoio uma invasão", insistiu o mandatário, temeroso das consequências de uma guerra ao outro lado da fronteira.

Argentina: O Alinhamento Incondicional com Washington

Em contraste marcante, a Argentina sob o comando de Javier Milei mantém um alinhamento sem nuances com os Estados Unidos. O país já havia rompido relações com a Venezuela há um ano e meio e foi um dos que não assinaram o artigo na reunião da CELAC que definia o Caribe como "zona de paz" para não desagradar Trump. Milei, que frequentemente se refere a Maduro como "ditador" e "a pior cloaca do planeta", praticamente entregou sua política exterior aos desígnios de Washington. Há expectativa na Casa Rosada de que Trump peça apoio argentino ativo contra a Venezuela, inclusive com participação militar, tendo o país já participado de exercícios navais no Caribe coordenados pelo Comando Sul dos EUA.

Um Cenário Geopolítico Transformado

A crise com a Venezuela ocorre em um contexto regional transformado, onde a hegemonia dos EUA não é mais absoluta. A crescente influência de potências como China e Rússia, e a atuação de blocos como os BRICS (que inclui Brasil e Venezuela), criam um tabuleiro geopolítico mais complexo. Enquanto isso, Maduro fortalece seus laços com Pequim e Moscou, buscando contrabalançar a pressão norte-americana.

Com a região dividida e a crise aérea aprofundando o isolamento de Caracas, o continente se vê diante de seu momento de tensão geopolítica mais agudo em anos, em que a defesa da soberania e a busca por uma solução pacífica se chocam com a lógica da intervenção e do alinhamento automático.

Com informações de El País, CNN Español, BBC, Tiempo AR, Contralinea, DGCS UNAM ■